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Editorial: Nelson Rodrigues no chão do palco
Lídia Kosovski
Henrique Buarque de Gusmão
Henrique Brener Vertchenko
Para citar este artigo:
KOSOVSKI, Lídia; GUSMÃO, Henrique Buarque de;
VERTCHENKO, Henrique Brener. Editorial: Nelson
Rodrigues no chão do palco. Urdimento – Revista de
Estudos em Artes Cênicas, Florianópolis, v. 4, n. 49,
dez. 2023.
DOI: 10.5965/1414573104492023e0101
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Florianópolis, v.4, n.49, p.1-7, dez. 2023
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Editorial: Nelson Rodrigues no chão do palco
Lídia Kosovski1
Henrique Buarque de Gusmão2
Henrique Brener Vertchenko3
Resumo
É apresentada, neste editorial, a proposta que mobilizou os editores: discussões
diversas sobre a prática da obra de Nelson Rodrigues em cena. Os diferentes textos
que compõem o dossiê tratam de montagens de peças, crônicas e romances
rodrigueanos e são brevemente comentados neste texto de abertura do dossiê.
Palavras-chave
: Nelson Rodrigues. Encenação. Teatro brasileiro.
Editorial: Nelson Rodrigues on the stage floor
Abstract
In this editorial, the proposal that mobilized the editors is presented: various
discussions about the practice of Nelson Rodrigues' work on stage. The different
texts that make up the dossier discuss staging of Rodriguean plays, chronicles and
novels and are briefly commented on in this opening text of the dossier.
Keywords
: Nelson Rodrigues. Staging. Brazilian theater.
Editorial: Nelson Rodrigues en el piso del escenario
Resumen
En este editorial se presenta la propuesta que movilizó a los editores: diversas
discusiones sobre la práctica de la obra de Nelson Rodrigues en escena. Los
diferentes textos que componen el dossier tratan de puestas en escena de obras de
teatro, crónicas y novelas rodrigueanas y se comentan brevemente en este texto
inicial del dossier.
Palabras clave: Nelson Rodrigues. Puesta en escena. Teatro brasileño.
1 Doutorado em Comunicação e Cultura pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil(2001). Pós
Doutorado pelo Prourb/ Universidade Federal do Rio de Janeiro , Brasil, 2016. Professora Associada da
Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro/Unirio, Brasil. lidia.kosov@gmail.com
http://lattes.cnpq.br/3535347423739325 https://orcid.org/0000-0001-8194-6559
2 Doutorado em História Social pela Universidade Federal do Rio de Janeiro, Brasil(2011). Professor Adjunto da
Universidade Federal do Rio de Janeiro , Brasil. henriquebgusmao@gmail.com
http://lattes.cnpq.br/8821514606183469 https://orcid.org/0000-0002-8770-6748
3 Doutor e Mestre em História pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG). Técnico em arte dramática
pelo Centro de Formação Artística (CEFAR) da Fundação Clóvis Salgado.
henriquevertchenko@yahoo.com.br
http://lattes.cnpq.br/0889237025627229 https://orcid.org/0000-0001-9348-3328
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Comecemos este editorial pelo óbvio ululante: Nelson Rodrigues é presença
obrigatória em qualquer história do teatro brasileiro. Se, por um lado, hoje não
é mais possível afirmar que
Vestido de Noiva
foi a única peça responsável pela
criação de um teatro moderno no Brasil, por outro, é inegável o impacto que este
segundo texto teatral de Nelson teve entre artista e intelectuais, afirmando-o
como um dramaturgo incontornável do cenário nacional. A partir dessa primeira
consagração, desenvolve-se um estilo dramatúrgico reconhecível logo na primeira
linha de qualquer peça sua. Articulando a linguagem da rua, o modo jornalístico de
tratar o mundo e uma complexa visão trágica da realidade, Nelson Rodrigues cria
um modo próprio de escrever para teatro que se afirmará no cenário cultural
brasileiro até os dias de hoje, impulsionando trabalhos não apenas na cena, mas
no cinema, na literatura, na reflexão crítica e historiográfica.
Partindo de um enfoque específico, os estudos aqui reunidos concentram-se
na prática do universo rodriguiano no chão dos palcos. Desde 1941, quando sua
primeira peça é montada no Rio de Janeiro, até hoje, a história das encenações da
obra de Nelson Rodrigues se confunde com a própria história do teatro brasileiro
no século XX agora entendida como história do espetáculo, numa concepção
mais recente e provocadora. De fato, inúmeros são os intérpretes que sobem ao
palco para montar um Nelson, de Cacilda Becker a Dercy Gonçalves, de Abdias do
Nascimento a José Wilker. Diretores como Ziembinski, Renato, Bibi Ferreira,
Martim Gonçalves, Marcos Flaksman, Antunes Filho, José Celso Martinez Corrêa,
Aderbal Freire Filho, Antonio Abujamra, Luiz Arthur Nunes e Cibele Forjaz
experimentaram as tantas formas que os textos do dramaturgo permitem.
Inúmeros foram também os cenógrafos, iluminadores e figurinistas que
encontraram desafio nas encenações de Nelson Rodrigues, feitas nas mais
diferentes linguagens e perspectivas estéticas. No mesmo sentido, sua
dramaturgia foi e é continuamente explorada por grupos de menor projeção,
conjuntos amadores, escolas de teatro e cursos universitários.
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A proposta deste dossiê é uma das realizações de um projeto de pesquisa
apoiado pela Faperj, que investiu na produção de memória de montagens de textos
rodriguianos até 1980, ano da morte do dramaturgo. Através de levantamento de
diferentes vestígios de alguns espetáculos (incluindo entrevistas com artistas que
dividiram o cotidiano de um teatro com Nelson Rodrigues), foi possível revelar todo
um mundo criado pela presença de um artista provocador no ambiente da
encenação de seus textos. A proposta é aqui ampliada, sendo pensada a prática
teatral dessa obra num período mais longo e por outras perspectivas.
O dossiê tem início com o artigo de Henrique Vertchenko,
Vestido de Noiva
(re)estreia: encenar a modernização do teatro brasileiro (1943-1976)
, propondo
examinar a construção e constante reelaboração do estatuto canônico desta obra
como fundadora de princípios estéticos da modernidade teatral brasileira. Para
tanto, como parte de um amplo conjunto de instâncias de consagração, são
analisadas diversas montagens do texto ao longo das décadas, capazes de
evidenciar tal processo de legitimação, suas complexidades e consequências para
a memória e a historiografia teatral.
Na sequência, Luís Artur Nunes, com o artigo
A encenação de contos de "A
vida como ela é..."
de Nelson Rodrigues, apresenta seu longo contato com a obra
do dramaturgo, o que resultou em formas originais de trabalho desenvolvidas para
montagens feitas a partir de sua prosa. Detalhando os caminhos de sua própria
direção e a elaboração de linguagens específicas, Nunes traz contribuições que
desvelam com propriedade procedimentos de criação de espetáculos importantes
no cenário cultural brasileiro, ao mesmo tempo em que manifesta potencial
pedagógico por meio de uma rica descrição de técnicas e recursos de teatralidade.
De maneira complementar, o artigo de Nara Keiserman,
Correio sentimental
de Nelson Rodrigues e A prosa do Nelson
, do Núcleo Carioca de Teatro, se debruça
sobre os processos de criação de duas montagens em que a autora esteve
envolvida entre os anos de 1999 e 2000, também dirigidas por Luís Artur Nunes,
sozinho ou em parceria. Ocupando a posição de uma “artista-docente-
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pesquisadora” do âmbito universitário, a autora demonstra em um artigo onde
o ato de rememoração possui papel significativo – a elaboração de uma pesquisa
de linguagem e os caminhos pelos quais chegou-se a determinados resultados
estéticos.
Em Encontros entre o Grupo Galpão, Eid Ribeiro
e Nelson Rodrigues
- A
encenação de Álbum de Família
, Rodrigo de Freitas Costa esmiúça os elementos
e analisa os sentidos da montagem que, em 1990, foi responsável pelo começo da
projeção do grupo mineiro para além de seu estado natal. Diferentes matrizes – a
trajetória do Galpão na década de 1980, o projeto artístico do diretor Eid Ribeiro e
a dramaturgia de Nelson são assim articuladas visando a compreensão de como
a releitura e apropriação de um texto guarda sempre significados particulares e
interpretações dinâmicas.
A investigação acurada de um espetáculo do passado também perpassa o
trabalho de Berilo Deiró Nosella, desta vez a partir de fontes específicas ainda
pouco utilizadas: os vestígios da iluminação. Em
Os documentos da iluminação
cênica e a pesquisa em história do espetáculo: o Vestido de Noiva de 1943
, a
encenação d`Os Comediantes é retomada por meio de uma proposta
metodológica que cruza diferentes indícios de usos da luz para se explicitar
tecnicamente o porquê da iluminação de Ziembinski ser reconhecida como
revolucionária no Brasil de então. Chama-se atenção, portanto, para as
potencialidades dos documentos do fazer teatral para as pesquisas em história do
espetáculo.
o artigo de Paula Sandroni,
Um romance frenético em cena: O Casamento
,
faz um relato detalhado sobre a adaptação teatral de João Fonseca e Antonio
Abujamra do romance
O Casamento
, de Nelson Rodrigues, encenada pela Cia.
Fodidos e Privilegiados no ano de 1997 no Rio de Janeiro. A autora analisa a história
da adaptação do livro trazendo diversas chaves cênicas utilizadas pela direção do
espetáculo, num percurso narrativo que permite ao leitor uma boa visualização da
cena sobre o palco. Com grande repercussão em seu trajeto, o espetáculo
representou o Brasil no XXII FITEI (Festival Internacional de Expressão Ibérica) no
Porto, em Portugal, em 1999, e no VII Festival Ibero-americano de Teatro de Bogotá,
Colômbia, em 2000.
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Em proposta bastante desafiadora e politicamente urgente, ao levantar um
debate atualizado sobre questões de gênero, o artigo
O Beijo [Cancelado]: pontos
de tensão na obra de Nelson Rodrigues
de Patrícia Leonardelli trata da experiência
de montagem de um monólogo inspirada na peça O Beijo no Asfalto de Nelson
Rodrigues . O texto apresenta o processo de estruturação da cena a partir do jogo
de identificação dos pontos de tensão dramática vistos sob a ótica do conceito de
punctum de Roland Barthes, e tem como um dos alvos principais o
reconhecimento da especificidade do corpo do ator cisgênero quando desafiado a
representar personagens marginalizados.
Vestido de Noiva
é novamente objeto de pesquisa, agora a partir de uma
montagem recém estreada pelo Grupo Officina Multimédia, de Belo Horizonte.
Vestir-se de palavra, noivar-se à Nelson -Teatro multimeios de Ione de Medeiros
para texto rodriguiano
, de Fabrício Trindade Pereira, evidencia as formas de
apropriação de um texto clássico, considerando, por um lado, suas inovações
dramatúrgicas e, por outro, o projeto estético e a linguagem desenvolvida pelo
grupo e por sua diretora ao longo de trajetória longeva.
Encerrando a seção de artigos, em
Uma serpente operística A encenação
da última peça de Nelson Rodrigues
, a autora Andréa Renck parte de uma coerente
análise histórica sobre este que é considerado o mais sintético texto do autor,
enfocando questões de cunho cenográfico. Pautado em descrições combinadas
com desenhos de projeto, o artigo Ilumina o processos da criação espaço-
ambiental e seus usos cênicos no espetáculo dirigido e cenografado por Marcos
Flaksman na sua estreia, em 1980. O trabalho descreve e comenta com muita
pertinência esta realização.
Além desses nove artigos, integram o dossiê um relato e uma resenha. No
primeiro,
Cenografia de Paraíso Zona Norte e de outros Nelsons
, ao compartilhar
sua história pessoal, J. C. Serroni traz a público sua experiência de vida profissional,
como possível fonte de reflexão para pesquisadores e artistas. Trata-se de um
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relato que tem como motivação principal “o lugar de fala do cenógrafo”, ao
apresentar as relações poéticas viso-espaciais contidas em cenas elaboradas em
parceria com criadores como Antunes Filho. Neste relato, Serroni relembra as
soluções cenográficas para espetáculos como
Paraíso Zona Norte, Álbum de
Família, Beijo no Asfalto, Os Sete Gatinhos, Toda Nudez Será Castigada e Vestido
de Noiva
.
Por fim, a resenha
Nelson Rodrigues: um trágico à brasileira
, de Rodrigo Alves
do Nascimento, faz uma apreciação acurada e com grande domínio bibliográfico
do livro Formulações do trágico no teatro de Nelson Rodrigues, de Elen de
Medeiros. Trata-se de obra recente que se soma à longa linhagem de debates em
torno do dramaturgo. A análise de Nascimento instiga a leitura ao incidir o olhar
sobre pontos precisos da sustentação argumentativa da autora, que propõe novas
chaves interpretativas para a poética do teatro rodriguiano.
Passados os 110 anos do nascimento do dramaturgo, comemorados em 2022,
bem como a aproximação dos 80 anos da estreia de
Vestido de Noiva
, em 2023, o
lançamento de um dossiê pretende contribuir para o alargamento das pesquisas
e debates décadas presentes na produção acadêmica brasileira.
Nelson
Rodrigues no chão do palco
vem a público, portanto, atestando a permanência de
um interesse atualizado e diversificado por sua obra e pelas práticas que lhe dão
vida diante da plateia. O comitê editorial agradece especialmente à revista
Urdimento pela abertura à proposta e por sua inestimável e contínua contribuição
aos estudos teatrais no país. Boa leitura!
Recebido em: 07/12/2023
Aprovado em: 07/12//2023
Universidade do Estado de Santa Catarina
UDESC
Programa de Pós-Graduação em Teatro
PPGT
Centro de Arte CEART
Urdimento
Revista de Estudos em Artes Cênicas
Urdimento.ceart@udesc.br