O que é escrita performativa?

 What is performative writing? 

 

Inês Saber de Mello

Doutoranda e mestra em Teatro da UDESC, graduada em letras (UFPR) e em dança (UNESPAR); professora-estudante, faz uma meta-pesquisa buscando ações, espaços e experiências coletivas de escritas

inessaber@gmail.com   https://orcid.org/0000-0002-9427-9844

Franciele Machado de Aguiar

Doutoranda em Teatro na UDESC, mestra em Artes Cênicas e bacharela em Teatro pela UFRGS. Atriz, professora, gosta de cantar e de escutar as vozes das pessoas.– aguiafranciele@gmail.com  https://orcid.org/0000-0002-0327-247X

Jussara Belchior Santos

Bailarina gorda. Doutoranda e Mestra em Teatro da UDESC. Criou Peso Bruto (2017), para discutir corpo gordo na dança. Interessa-se por poéticas e políticas de movimento e posicionamento através da dança

jusbelchior@gmail.com   https://orcid.org/ 0000-0002-8592-6229

Luane Pedroso de Oliveira

Doutoranda e mestra em Teatro da UDESC. É atriz, bailarina, gosta muito de teatro de bonecos. Arrisca-se em instrumentos percussivos e adora música brasileira. Nasceu em uma família de artistas, o que para ela foi de vital importância em sua formação, que se deu, sobretudo, do lado de fora da Academia. Tem a sorte de amar o que faz.

luane.mainha@gmail.com  https://orcid.org/0000-0001-8127-617X

Matheus Abel Lima de Bitencourt

É artista visual e mestrando em Processos Artísticos Contemporâneos na UDESC. Investiga processos de escrita e modos de leitura. Pensa o pensar o processo enquanto obra

talveztenhaavercomarte@gmail.com   https://orcid.org/0000-0002-2214-4377

Tereza Mara Franzoni

Professora do Departamento de Artes Cênicas e do Programa de Pós Graduação em Teatro da UDESC. Possui doutorado e mestrado em Antropologia Social da UFSC e graduação em Ciências Sociais pela UFSC

  franzoni@gmail.com   https://orcid.org/0000-0003-2498-085

 

Resumo

Este texto é uma apresentação de formulações, modos e imagens a partir da pergunta-título ‘o que é escrita performativa?’, apresentando a coletânea de textos da proposta Do tema aos modos, reflexões e invenções: pesquisa em artes e as escritas da pesquisa, produzidos por artistas-pesquisadoras e pesquisadores de diferentes universidades brasileiras, que trazem consigo o interesse e exercício reflexivo da Pesquisa em Arte na e pela escrita, através de seus procedimentos e possibilidades.

Palavras-chave: Artes cênicas. Escrita e arte. Performance (Arte).

 

Abstract

This text is a presentation of formulations, ways and images based on the title question 'what is performative writing?', presenting the collection of texts from the proposal From theme to ways, reflections and inventions: research in arts and research writing, produced by artist-researchers from different Brazilian universities, who bring with them the interest and reflective exercise of Research in Art in and through writing, sharing their procedures and possibilities.

Keywords: Performing arts. Writing and art. Performance art.

 

DOI: http://dx.doi.org/10.5965/1808312915252020e0015

Recebido em: 10/06/2020

Aceito em: 07/07/2020

 


 

e o que é o que é o que é o que é o que é o que é o que é o que é o que é ESCRITA? o que é o que é o que é o que é o que é o que é o que é o que é a ESCRITA de ARTISTA? e o que é o que é o que é o que é o que é o que é o que é PESQUISA? e o que é o que é o que é o que é o que é  o que é o que é o que é a ESCRITA NA PESQUISA? e o que é o que é o que é o que é o que é o que é PESQUISA EM ARTE? e então o que é e por que é o que é O que é ESCRITA PERFORMATIVA?

 

este texto foi produzido por artistas-etc.[1]:

 

Caras leitoras e leitores,

Gostaríamos de tentar conciliar coisas diferentes neste texto que se abre para tratar da escrita nas pesquisas em Artes Cênicas: a nossa ação enquanto Corpo Editorial, um breve apanhado dos conceitos e práticas que nos permitem pensar a escrita na academia.

O ponto de partida é anterior ao método. Segundo o filósofo italiano Giorgio Agamben (2010), o método na pesquisa nas ciências humanas não é anterior à prática; os procedimentos de investigação são definidos a posteriori[2] já que o hábito de pensar destas é longo e contínuo.

Na arte, especialmente na forma como é feita hoje, é possível listar uma série de razões para que os métodos tenham caráter processual, passível de mudanças. Dentre algumas estão: a fragmentação, a provisoriedade, o sintomático, a continuidade de práticas (que podem vir a gerar produtos e ações); o borramento das noções de participação e autoria, artista e espectadoras(es); as proposições que não excluem a possibilidade da catástrofe, as reconfigurações que moldam ações e/ou formas.

Um exemplo desse caráter processual pode ser notado no trabalho do artista estadunidense Lawrence Weiner (2014), que o descreve como algo constituído de frases ou palavras adesivadas em grande escala em paredes ou fachadas de prédios – estas, na realidade, são esculturas: "o significado das palavras quase sempre muda. Mas as coisas em si, não". Partindo desse ponto, Weiner indica que seu trabalho não apresenta "metáfora alguma", mas deixa aberto seu significado para que o es/xpectador[3] utilize-o como lhe parecer melhor, criando assim seu próprio significado particular para cada pessoa.

O professor e pesquisador argentino Reinaldo Ladagga afirma que estamos em uma fase de mudança de cultura nas artes[4]; em Estética da Emergência (2012), aponta uma disposição à reflexividade nas artes, trazida pelo modernismo – que para o autor ainda não foi superado – direcionando a erosão da certeza do conhecimento, ou seja, “toda posição estabelecida deve ser considerada a priori suscetível de revisão” (p. 60-62). Ao pesquisar artes, precisamos, então, estar cientes da transitoriedade dessa fase: desgarrar de um sistema de pesquisa fechado e permitir que outras formas e práticas surjam.

O termo Pesquisa em Artes é bastante difundido no Brasil, remete-se ao trabalho de pesquisa realizado por artistas com uma dupla face: a criação artística/o processo de investigação e a apresentação dos resultados/reflexões deste trabalho. Silvio Zamboni, em sua tese (1998), traça um paralelo entre arte e ciência e o contexto histórico da pesquisa em artes; ele explica que a área se efetivou dentro do CNPq na década de 1980, criando modos de gerenciamento, normatização e fomento das pesquisas.

Com pouco mais de 50 anos dessa efetivação, vivemos agora um momento de ameaças de cortes de investimentos e subsídios na pesquisa e educação. Por isso, ao invés de uma tentativa de consolidação de um sistema por parte de artistas pesquisadoras e pesquisadores, há uma postura autocrítica, gerando emergências de outras formas, fazeres, vozes e saberes.

     O exercício intelectual e estético da construção da Pesquisa em Artes (e sua escrita) é consonante com o período de transitoriedade da cultura das artes e do movimento de e para a coletividade, atravessado por experiências (sociais, coletivas e também pessoais) de leitura, de arte e de vida. Este exercício tem diversas faces como criação, crítica e ensino, e diferentes manifestações e metodologias. Dentre as metodologias e caminhos de pesquisa que apareceram nesta coletânea listamos: Pesquisas guiadas pela prática como a Pesquisa Performativa[5] e a Pesquisa Somático Performativa[6]; há também os caminhos da Etnografia, Autoetnografia[7], Pesquisa Cartográfica[8], Artetnografia e Mitodologia em arte[9], que reverberam em escritas fragmentárias, epistolares, ensaísticas e narrativas.

As leitoras e leitores que não busquem neste texto algum tipo de resolução,

escrever é estar em contradição

pesquisar é também apontar a contradição

dentre os motivos da impossibilidade de uma resposta encerrada, podem ser facilmente listados alguns:

a)      Aquele clichê de que há muito o que se dizer sobre escrita e sobre o performativo – sim, há diversos caminhos, alguns concomitantes, outros divergentes que tornam escolha, qualquer que seja ela, a exclusão de possibilidades que poderiam e talvez devessem ser fundantes;

b)      Uma condição permissiva de escrita que a aproxima de existências mais do que de significados, por se deixar influenciar pelas qualidades do que está entre, pelo que não pode ser inteiramente capturado ou articulado e assim se tornar uma experiência em seu próprio-movimento-próprio, cheia de possibilidades relacionais;

c)      O fenômeno é relativamente novo, nos últimos 30 anos se intensificaram as discussões do que pode ser a escrita na Pesquisa em Arte;

d)      O conceito de texto se dinamizou, está mais aberto e polissêmico, há uma maior preocupação com sua produção e recepção, seus desdobramentos e metamorfoses.

 

AS VOZES DA ESCRITA: O COTIDIANO, O PESSOAL, O POLÍTICO, O CORPO, O TEXTO, A ESCRITA, AS VOZES DELAS, AS VOZES DELES

 

Ao propormos um exercício performativo de escrita, que pudesse se estender dos temas das pesquisas aos modos pelos quais os conhecimentos que ali urdimos ganham forma e são compartilhados, perguntamos também quais estratégias de escritas poderiam chamar atenção para as estruturas patriarcais e coloniais nas quais a academia se sustenta. Perguntamos como essas escritas podem desvelar o machismo, o racismo, o elitismo, institucionais e sistêmicos, incorporados muitas vezes como hábito. Como uma outra forma de escrita poderia questionar tais estruturas, fissurar, oferecer possibilidades, desempenhar um papel ativo nas transformações das quais tanto necessitamos? Nesse contexto, é interessante pensarmos nos feminismos, nos caminhos e contradições através dos quais eles se estruturam enquanto movimento, e perceber, ali, percursos semelhantes ao performativo como escrita acadêmica, como escrita possível na academia e, finalmente, sua função na e para além da academia.

 

Ao escrever, lembrar que (2020). Colagem.  Fontes: print de stories Instagram de Francisco Mallmann, página do The City Fix Brasil[10] e fotografia de mostra na Pinacoteca de São Paulo[11]

 

Gloria Anzaldúa, em Falando em línguas: uma carta às mulheres escritoras do terceiro mundo, escreve:

Nós falamos em línguas, como os proscritos e os loucos. Porque os olhos brancos não querem nos conhecer, eles não se preocupam em aprender nossa língua, a língua que nos reflete, a nossa cultura, o nosso espírito. As escolas que frequentamos, ou não frequentamos, não nos ensinaram a escrever, nem nos deram a certeza de que estávamos corretas em usar nossa linguagem marcada pela classe e pela etnia (Anzaldúa, 2000, p. 229).

 

 

Anzaldúa segue: “Escrevo para registrar o que os outros apagam quando falo, para reescrever as histórias mal escritas sobre mim, sobre você” (2000, p. 232). Contar a história apagada, usar a linguagem marcada pela experiência, são caminhos possíveis para uma escrita performativa, feminista, decolonial.

Nos textos que compõem esta coletânea, acompanhamos uma busca por modos de escrita que se desdobram em múltiplas estratégias e desejos: desierarquizar, descolonizar, questionar estereótipos, construir pedagogias e métodos que surjam da prática, da materialidade, do cotidiano, da experiência, do tempo (cada vez mais fugidio) presente. Cartas, diagramas, imagens, fragmentos de diário, notas, caixas de texto, dança, palavras pescadas, cantos, listas de tarefas, bicicletas, vidros quebrados, citações, livros didáticos, fogo, terra, ar, água, referências, louças na pia, alunas e alunos, processos criativos, salas de aula, crianças, jovens, escolas, texturas, cores, peles, pesos, quedas, sons, traços, biografias, autobiografias, ficções, autoficções, f(r)icções, memória, imaginação, asfalto, areia, travesseiros, ideias, sonhos, despertadores.

No percurso de leitura perguntamos como escritas performativas e feminismos se encontram, como uma escrita performativa pode ser também uma escrita feminista. Percebemos que, por meio de diferentes recursos, as palavras e imagens revelam o corpo de quem escreve, mostram a subjetividade desses corpos, sua história, sua singularidade, unicidade; enfim, suas vozes. Nessa aventura de contar-nos[12] alcançamos o coletivo a partir da experiência, e não de generalizações que invisibilizam a diferença em nome de pretensas universalidades.

O conhecimento que cada pesquisa constrói e compartilha não é neutro: é contextual, relacional, incorporado na prática artística, docente, acadêmica de cada uma e de cada um. Tanto quanto os temas, interessam-nos os modos pelos quais nos comunicamos, os modos pelos quais esses saberes estabelecem conexões com o dia a dia, os modos pelos quais aprendemos e ensinamos, os modos pelos quais podemos transformar(-nos). Quando nos percebemos enredadas em uma estrutura que nos adoece, precisamos construir uma rede que nos ampare, que nos permita dizer, pensar, cantar a muitas vozes: eu também. Assim, seguimos acreditando e alimentado a potência da arte, da educação, da pesquisa, mesmo em momentos em que elas sofrem tantos ataques.

bell hooks[13] (2019; 2018), conta-nos sobre o surgimento do movimento feminista e sobre como ele era, em seus inícios, estruturado pela prática, pela vida das mulheres.[14] Pela percepção e afirmação das conexões entre o pessoal e o político. Tais conexões — que a escrita performativa também estabelece quando opera um engajamento, um investimento de si por parte de quem escreve — permitem que realizemos um exercício de imaginação sociológica, conectando o cotidiano das autoras cujos textos integram esta coletânea, às questões que nos afetam coletivamente. O pessoal é político, e as cartas entre quatro artistas-pesquisadoras-professoras[15], os relatos de práticas artísticas e docentes, falam e tocam a todas nós, a todos nós. Ao falarem sobre suas experiências, elas falam sobre si e falam também sobre nós. E falam conosco. Sua escrita é ação e convite para agir.

O que seria o performativo que adjetiva as escritas aqui reunidas? Poderíamos apontar como características do performativo: o apelo a outros modos de percepção (e no caso do texto, a própria ressignificação do que é considerado texto); o caráter processual, inacabado, de algo que está sendo feito, do que está sendo composto através de uma colagem de diferentes formas e gêneros; o espaço para o cotidiano, a não separação entre arte e vida; a (re)inscrição da arte no domínio político; o deslocamento dos códigos; a possibilidade do risco, do malogro, do erro que acompanha a tentativa; a ludicidade das formas visuais e verbais do discurso; a performatividade como experiência e como execução de uma ação.

Percebemos tais marcas nos textos com trechos riscados aparentes, acompanhando as decisões e o investimento de tempo e energia, os movimentos de corpos e pensamentos, a videodança imaginada nas tarefas domésticas, os fragmentos de caos e de cacos de vidro, as imagens que nos atropelam, o tempo que nos atropela, nos cronometrados cinquenta minutos de uma aula de artes na escola pública, os fragmentos de discurso nos diálogos entre pessoas afásicas, as aproximações e afastamentos entre espaços e alteridades. O grande espaço vazio nas páginas à espera, enquanto o ponto de inserção aguarda a digitação das palavras.

Os textos que seguem desafiam suas próprias autoras e autores a olharem para a forma como escrevem, a perguntarem por que o fazem obedecendo a determinadas formas e deixam outras tantas possibilidades. O que torna um texto “publicável” em periódicos, “legível”, “compreensível”? No ensaio A língua. Ensinando novos mundos, novas palavras, bell hooks reflete sobre o colonialismo que opera na linguagem, nos vínculos entre língua e dominação. Como transformá-la numa contralíngua, num espaço de resistência? Na escuta das canções dos escravizados afro-americanos, dos spirituals, bell hooks chama a atenção para as construções gramaticais que quebram, despedaçam o inglês padrão:

 

[...] o poder dessa fala não é simplesmente o de possibilitar a resistência à supremacia branca, mas também o de forjar um espaço para a produção cultural alternativa e para epistemologias alternativas - diferentes maneiras de pensar e saber que foram cruciais para a criação de uma visão de mundo contra-hegemônica. (hooks, 2019, p. 228).

 

Refletindo a partir dessas considerações, reconhecemos, nas escritas que aqui apresentamos, trechos em que uma fragmentação da língua e das estruturas da escrita acadêmica se coloca em curso. Conhecer em fragmentos, conceber espaços em que não compreendemos o todo é, segundo bell hooks, uma estratégia pedagógica e política: podemos ouvir sem “dominar” ou “conquistar” a narrativa como um todo, podemos escutar sem “tomar posse” da interpretação.

Entramos em contradição. Revisamos os textos acossadas por uma tal “norma culta”. Escrevemos aqui na língua de nossos colonizadores. Mas o que podemos fazer com ela? E quantas outras línguas e saberes silenciados deveriam ocupar este espaço?

Pensando no que bell hooks (2018) nos conta sobre a construção da teoria feminista, parece haver um paralelo, um reconhecimento entre teoria feminista e pesquisa em arte (e sua escrita). Para que(m) elas servem? Quando falamos, pensamos sobre, buscamos por modos de escrita performativa, estamos buscando também um sentido para o que fazemos. Um encontro transformador entre estética e política, uma busca por tornar acessíveis os conhecimentos gerados nesse encontro. Algo ainda mais urgente quando nos damos conta de que ocupamos espaços e recursos públicos e que tais recursos devem ser partilhados, servirem ao bem comum e não se encerrarem em muros de privilégios. bell hooks nos diz: a academização pode enfraquecer o movimento feminista, ao despolitizá-lo. Uma teoria que se restringe ao público acadêmico torna-se um gueto com pouca conexão com o mundo lá fora. Precisamos basear nossos estudos e pesquisas na comunidade, pensar em um comum. Alcançar além da palavra acadêmica e até mesmo da palavra escrita, pensar outros recursos de compartilhamento de conhecimento. Uma educação feminista, um conhecimento feminista.

Compartilhar experiências na escrita, escrever a partir da prática. Mas ainda e sempre é preciso perguntar: quem está compartilhando suas experiências e práticas? A escrita acadêmica precisa encarar suas contradições para que possa ser inventada e reinventada a cada momento, a cada pesquisa. Nesta coletânea de textos, houve tentativas de vincular o que jamais deveria ter sido desvinculado: a subjetividade de quem pesquisa, com as pessoas, matérias, teorias, conceitos que surgem desse investigar. O conhecimento e o cotidiano, a arte e a vida. Esse conhecimento, essa arte, servindo como intervenção na vida, como transformação da vida, desenhando-se como práxis, teoria e prática informando-se mutuamente. Uma escrita que flexiona substantivos e adjetivos no feminino nos faz pensar em gênero, em corpo, naquelas que estão por trás das páginas, que escrevem as palavras. Nos obstáculos que encontram para conciliar o trabalho acadêmico com o invisível e desvalorizado trabalho de reprodução social. Nos obstáculos que encontram para ocuparem o espaço acadêmico. Quantas mães pesquisadoras puderam participar desta coletânea? Quantas mulheres negras? Indígenas? Trans? A escrita performativa é para que(m)?

Chamar atenção para a impraticabilidade de apresentarmos uma proposição desveladora e encerrante não é um pedido de desculpas por falta de acabamento, por possíveis ingenuidade(s) ou por praxe. Pelo contrário, apresentam-se incertezas porque estamos cientes da crescente instabilidade da produção e da própria sobrevivência da ciência e da academia brasileira. Com consciência tomada e partilhada, temos responsabilidades e demandas a cumprir, conhecimentos e memórias a reiterar (e, consequentemente) práticas a incorporar. Aliás que fique dito,

 

Por favor, aperte essa ferida

tem coisa que não se pode deixar passar batido

 

especialmente se essa ferida for excludente, racista, gordofóbica, misógina, transfóbica, colonial ou complacente com violências. O perigo é real, e este não é algo que queiramos correr aqui.

 

Mesmo não sendo um desafio exclusivo das pesquisas em arte, escrever (na academia) é por vezes ignorar grande parte da experiência. Ao buscar o que pode ser isolado, traduzido e reproduzido das experiências sensíveis, reduzimo-las a experimentos - com exatidão, comprovação científica, e até a possibilidade de previsões futuras[16].

No entanto, é impossível cercar forças que atravessam o acontecimento – estão entrelaçadas. O dilema da pessoa pesquisadora-artista está posto: relacionar-se com o que é sensível, instável e processual produzindo, através (da descrição) da experiência, uma escrita que, por ser científica, tem por finalidade mostrar fontes, resultados e conclusões.

 

O QUE NÃO É ESCRITA PERFORMATIVA

 

A escrita performativa não é uma guerra contra a ABNT.

 

A escrita performativa não substitui e nem se pretende melhor que outras escritas, advoga contra o perigo da História Única[17] que cria e perpetua noções incompletas, apartadas da experiência, ou seja, estereótipos.

 

Ah! Que difícil!

Estou carregando cinco livros na mochila, o computador, a garrafa d’água e uma blusa para aguentar o frio da biblioteca. Estou empacada, sentada há horas na frente disso aqui.

Já comecei isso várias vezes e nada deslancha.

Não dá para escrever isso sem explicar aquilo.

Será que rola uma nota de rodapé?

Onde é que tá aquela referência mesmo?

Tinha certeza que era desse livro.

Queria ter escrito esse livro.

Quais são suas referências?

Para quem você escreve?

Escreve isso que você falou agora.

Será que tem algum lugar para publicar esse texto assim?

E se a gente inventasse um espaço para caber?

Qual o prazo de submissão mesmo?

 

 

 

DO TEMA AOS MODOS, REFLEXÕES E INVENÇÕES: A PESQUISA EM ARTES CÊNICAS E A ESCRITA SOBRE A PESQUISA

 

...tudo começou assim: Ines Saber propôs que a pesquisa de seu doutorado em Teatro fosse não somente a análise de um corpo de dados, mas uma coleção de ações coletivas. Apostando em sua tese como uma possível consequência de ações na academia, Ines propôs, dentre tais ações, cursos de escrita para artistas na academia e uma chamada para um tipo de “dossiê” de textos performativos, com o intuito de discutir a escrita acadêmica na Pesquisa em Artes e a urgência do performativo, através de escritas de pessoas pesquisadoras artistas de diferentes universidades brasileiras. Se forma e conteúdo são intrínsecas em arte, e de mútua influência, por que a forma de pesquisá-la deveria ser estabelecida à priori?

 

Foi aí que surgiu uma chamada aberta para pesquisadoras e pesquisadores de pós-graduação em artes cênicas, teatro, dança e performance para a publicação de uma coletânea de textos cujos temas elencados foram: as metodologias que inventamos; a relação de duas mãos entre modo e conteúdo; as atualizações e alternativas aos formatos tradicionais; as reflexões sobre nossa postura frente às práticas de pesquisa e à escrita acadêmica.  Essa chamada defendia que a pesquisa em artes cênicas como uma procura metódica e consciente, seguindo critérios próprios (indefiníveis enquanto generalização), tratando de processos, subjetividades e suas implicações.

O convite para a escrita dessa coletânea foi bem amplo, sem restrições pré-estabelecidas quanto a formatação: nem referências, nem citações precisavam se restringir às normas ABNT, mas precisavam estar presentes de alguma forma - plágios não seriam aceitos. A escrita poderia tomar a forma que lhe coubesse, ou ainda, inventar outras formas, expandir seu espaço de ocupação, explorar o infinito que cabe em uma folha A4.

Para a submissão de um texto para essa coletânea, aceitou-se colaborações escritas em língua portuguesa de autoras e autores artistas (em parceria com pessoas acadêmicas), mestrandas e mestrandos, mestras e mestres, doutorandas e doutorandos, doutoras e doutores de área das artes.

A divulgação da chamada para publicação foi feita inicialmente em julho de 2019, através de e-mails para discentes do Programa de Pós-Graduação em Teatro da UDESC e para diferentes endereços eletrônicos de coordenações e secretarias de programas de pós-graduação em artes, artes cênicas, dança e teatro.

Em Setembro de 2019, Ines Saber participou do Seminário de Pesquisa em Andamento (SPA) da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo (ECA-USP). Imprimiu uma quantidade de panfletos com o chamamento para a publicação e entregou-os, juntamente com perguntas disparadoras de uma escrita para cada pessoa que assistiu apresentar, vinculadas às suas pesquisas. Além disso, no coquetel de encerramento do seminário, entregou os panfletos e convidou pessoas a escreverem textos performativos. A Equipe da Comissão Organizadora do SPA-USP foi bastante solícita, reencaminhando para todas as pessoas participantes do evento o chamamento para a publicação de textos performativos em uma revista.

Até o fim de setembro Ines recebeu quase 40 textos. A possibilidade de elaboração de uma coletânea de escrita, seja ela prática, crítica e política, tema, método e ação, de pessoas pesquisadoras e artistas, já não era uma idealização, mas uma ação conjunta, complexa, que necessitaria de mais pessoas para organizá-la. Aí surgiu o Coletivo Escrita Performativa com os seguintes integrantes: Franciele Aguiar, Jussara Belchior, Ines Saber, Luane Pedroso, Matheus Abel e Lucas Dalbem.

 

DAS NOSSAS ESCRITAS PERFORMATIVAS: TENTATIVAS, FRACASSOS, EXPERIÊNCIAS E FLERTES

Nós nos reunimos a primeira vez para olharmos os textos recebidos, um grupo inicialmente formado por estudantes de pós-graduação em Teatro e Artes Visuais, doutorandas e mestrandos, cujo interesse em escritas não colonizadoras, não apartadas do corpo, e em transitar pelos limiares entre a palavra e a imagem, permitiriam relações não hierarquizadas entre saberes, experiências e contextos de produção de conhecimento, sem medo de problematizar o próprio fazer. A relação forma/conteúdo não foi encarada como um dilema, mas um caminho a ser desvendado; da experimentação das opções das ferramentas de textos (cores das letras, cores das páginas, alinhamento do texto, caixa de texto, linhas recortando as páginas e imagens etc.) a outras mídias adaptadas a esta publicação (escritas a mão, bordados, fotografias).

A curiosidade pairava sobre relatos, metodologias, críticas e reflexões sobre pesquisas acadêmicas nos mais diversos formatos; eram textos muitos diferentes reunidos em uma publicação de-sobre-com escrita performativa. Lançou-se sobre nós uma pergunta: Como reuni-los? Para respondê-la decidimos que nosso critério de organização partiria da leitura, da demanda dos textos, encontrando na prática um modo de fazer coerente, estabelecendo campos de discussões através da escrita performativa. Isto posto, como propor um debate que se adensa não apenas na reflexão com os cruzamentos de referências, mas nas propostas inventivas, dissidentes, que tencionam as formas de relação entre os seres e as coisas em uma escrita acadêmica?

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

A Academia é um lugar de produção de discurso e cria um regime de autorização discursiva, que por sua vez é “ao mesmo tempo controlada, selecionada, organizada e redistribuída por [...] procedimentos que têm a função de conjurar seus poderes e perigos” (Foucault, 2012, p. 8). Em nossa sociedade temos uma longa tradição de humanidades negadas, muitas vozes demoraram tanto a ser ouvidas.

A exemplo disso, segundo os dados apresentados em Pequeno Manual Antirracista (Ribeiro, 2019, p. 49) só em 2012 foi implantada a lei de cotas federais nas instituições brasileiras de ensino superior;  em 2018, vemos o reflexo dessa mudança quando a estatística mostra que a maioria dos estudantes é negra (51,2%).

Sabemos que o “nós” dos textos acadêmicos ainda não necessariamente abarca vozes pobres, negras, transfeministas e outras muitas intersecções; afinal a academia é reflexo de um projeto europeu, branco e patriarcal. Não podemos nos esquecer que a linguagem é coerciva e naturalmente expropriada de experiência. Na busca por construir coletivamente esta coletânea, conversamos sobre tais questões e sobre os textos em si, e sobre o que as leituras e as reescritas nos trouxeram. Se estabelecêssemos regras, territórios ou categorias a priori, provavelmente favoreceríamos uma postura excludente e elitista. Como trabalhar, atravessar e revisar os assuntos dos textos sem verticalizar uma relação hierárquica de poder entre Corpo Editorial e autoras e autores?

Durante os encontros nosso posicionamento, enquanto coletivo, foi tomando corpo através do reconhecimento de tensões no nosso próprio fazer, entre o que se espera do trabalho de edição em publicações acadêmicas e os caminhos possíveis para fazer da academia um ambiente poroso - um espaço de insurgências de saberes que foram (e têm sido) outros para a academia. Em tempos de ameaças de desmontes da educação, a procura por outros modos de escrita é um convite à reflexão sobre nossas epistemologias. Nossas ações são um diálogo com o que já fora produzido pela pesquisa acadêmica brasileira em artes, ressignificando, alimentando e complexificando os arquivos que temos construído.

Com essa reflexão veio também o questionamento sobre nossa imagem. Por estarmos lidando com jogo de poderes, como poderíamos criar e manter um lugar de liberdade, inventividade e jogo sem abdicar de responsabilidades?

Debochando de nós mesmas.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Imagem - Parte do Coletivo Escrita Performativa - Do tema aos modos, reflexões e invenções: a pesquisa em arte e as escritas da pesquisa (Perucas de Suzaninha Richthofen[18]). Foto:  Luan Nagib, 2019. Fonte: Acervo pessoal

Em nossas estratégias de desestabilizar a ordem e despertar a curiosidade de leitoras e leitores, pensamos em apresentar as autoras e autores de uma outra forma. Ao contrário de priorizar os títulos acadêmicos ou as instituições em que os autoras e autores trabalham e/ou estudam, destacar os interesses e percursos dos pesquisadoras e pesquisadores. Pedimos que os as autoras e autores escrevessem uma minibio[19] sem citar esses dados convencionais. Nosso intuito era de chamar atenção do texto por seu assunto, não por sua autoria. Idealizamos desvincular essas pequenas biografias, assim como os resumos, das escritas. De tal forma, os leitoras e leitores poderiam buscar pelos textos a partir da atração pelas temáticas e abordagens.

 

 

 

 

                                                        

Uma imagem contendo texto  Descrição gerada automaticamente

Mineira, professora com formação em dança, mestra em artes cênicas, doutoranda em artes, pesquisadora de performance, jogo e fluxo na educação. Artista da dança, articula o ajuntamento abrindo a sala, que convida pessoas de diferentes querências e práticas a (se) ajuntarem (em) poéticas da convivência. Investiga modos de composição a partir dos conhecimentos e sabores do que não-se-sabe. Performer e educartista. Brinca com as possibilidades de aprendizagem que emergem de práticas performativas, dos não-saberes. Ressoam em seu corpo e interesse vozes das artes, da literatura e da filosofia. Professora/Artisteira. Propositora de invencionices brincantes com crianças pequenas. Habitante de muitas casas. Casa/Chão; Casa/Vento; Casa/Infância; Casa/Porão; Casa/Invenção; Casa/Escola; Casa/Vôo; Casa/Ficção; Casa/Sonho; Casa/Pesquisa; Casa/Devaneio; Casa/Teatro; Casa/Escritura. Lembro-me ainda do arrebatamento pela Arte quando ainda bem pequena deparei-me com um quadro que tinha uma fotografia de uma bailarina. Dancei, me formei em Teatro e tenho me tornado atriz e professora.  Enquanto atriz, me dedico a investigar as artes performativas; enquanto professora, sigo atravessada pelo meu interesse pela criança, por seu modo de ser e estar na arte e na vida. O que podemos fazer de Teatro com crianças tão pequenas?” A resposta: TUDO. Atriz, professora, gosta de escutar as vozes das pessoas e prefere cantar a falar. Quando ainda podia contar a idade nos dedos de uma única mão, transformou em microfone um pedaço de cano de PVC. Ao encontrar dramaturgia na estante da biblioteca da escola, decidiu brincar de teatro e o fez. E o faz. Tem meia dúzia de gatos: uma delas se chama Cigana e gosta de acompanhar as escritas deitada sobre livros e anotações feitas à mão. Professorartista pesquisadora gaúcha residente em Brasília com experiências múltiplas em dança e teatro. Meditadora. Investigadora de processos em dança contemporânea desde 2009. Mestra e Doutora. Diretora. Terapeuta Reiki. Professoramiga confidente. Consteladora Familiar (em formação). Professora de uma licenciatura em dança e integrante de grupo de pesquisa em improvisação. Pesquisadora e artista das artes do corpo. Meus trabalhos têm como eixo central as emergências, insurgências e potências que acontecem e fazem parte do corpo, constituindo-se de obras autorais e trabalhos coletivos com artistas parceiros. Atriz, bailarina, gosta muito de teatro de bonecos. Se arrisca em instrumentos percussivos e adora música brasileira. Nasceu em uma família de artistas o que, para ela, foi de vital importância para sua formação que se deu, sobretudo, do lado de fora da Academia. Ama cachorros e dias de sol. Prefere teatro a cinema. Não acredita no capitalismo. Gosta de escrever despretensiosamente. Tem a sorte de amar o que faz. Artista pop-nerd das visualidades do espaço e do tempo. Montando alegorias críticas sobre as possibilidades revolucionárias dos jogos, hqs, rpgs, cosplays, séries e filmes. Atriz, performer, encenadora, diretora, dramaturga e escritora. Professora-estudante, pesquisa e escreve “com” e “entre”; corpo, escrita, dança, performance e poesia, e faz de sua tese um conjunto de ações: propor coletivamente espaços e experiências coletivas de outras escritas em Pesquisas em Artes. Atriz, professora e diretora de Teatro desde 1991. Pesquisadora-artista-educadora, montanhista-dançarina, mãe, filha, (e aqui sobretudo) neta, artífice, costureira e bordadeira, graduada em dança, mestre em comunicação e semiótica, doutoranda em artes cênicas e professora. Artista cênica de interlinguagens e indisciplinar, produtora cultural, pesquisadora e provocadora de processos artístico-pedagógicos psicomágicos em contextos escolares e não-escolares. Faz questão de ser chamada de bailarina gorda. É paulistana filha de mineiros. Mudou-se para Florianópolis não pela praia, mas para integrar uma companhia profissional de dança, trabalhando ali por dez anos. Sua pesquisa acadêmica é interdependente de sua prática como artista.  Interessa-se por poéticas e políticas de movimento e posicionamento através da dança. Paulistano de nascimento, campineiro de formação e curitibano de morada, é membro fundador da quandonde intervenções urbanas em arte, palhaço (atuação e direção), vegano, pai da Luísa, ciclista e antifascista. Professor, diretor e ator. Estuda (des)hierarquização das funções teatrais, relações de poder e encenação teatral. Atualmente está interessado em processos e pessoas que estudam o aprender a aprender. Nasceu em 1990 na cidade de Peritiba e foi criada no interior da cidade de Concórdia, SC. Vive na ilha de Florianópolis há 10 anos, onde cursou a licenciatura em Artes Visuais. Viveu na Bolívia em 2013 e em Portugal em 2015/2016, onde estudou e trabalhou. Produz a partir da origem e prática camponesa, comunitária e matriarcal, articulando tentativas e processos de arte e de vida. Sombriense, artista visual, atualmente vive e trabalha em Florianópolis. Investiga processos de escrita e modos de leitura, propondo relações e tensões via a série de trabalhos mapas/esquemas/diagramas. Pensa o pensar o processo enquanto obra. Sou performer-cartógrafa-pesquisadora-docente. Minhas investigações ocorrem nos cruzamentos e nas linhas de fuga entre performance, teatro e dança. Meu processo de criação se desdobra em perguntas que estão continuamente se atualizando. Eis algumas perguntas da minha coleção: como desacostumar o olhar?; como estar à altura do que me acontece?; como contra efetuar os acidentes em vez de ressenti-los?

Para muitas pessoas artistas-acadêmicas o trabalho não é a escrita sobre, mas a escrita: da, na e com pesquisa. Sabe-se que a Pesquisa em Artes na academia seguiu os moldes das ciências humanas se estruturando, principalmente, em um fazer sobre algo. Artistas[20] que se tornaram docentes na academia mencionam a dificuldade de conciliar a pesquisa artística com a prática acadêmica, questão recorrente em alguns textos desta coletânea. Percebemos que a proposição desta coletânea foi um espaço para o exercício de uma escrita artística-acadêmica, enquanto tema e modo, uma maneira de aliar a pesquisa acadêmica e a pesquisa na prática artística.

Em algum momento de nossa trajetória enquanto Corpo Editorial, perguntaram-nos por que esta não seria uma publicação independente; buscamos uma parceria com professoras[21] na área de Artes já experientes na organização de dossiês e publicações em periódicos acadêmicos. Acreditamos que a publicação em uma revista acadêmica veio como forma de garantir, através da escrita, um lugar da produção acadêmica nas artes cênicas nas vertentes feministas, decoloniais e insurgentes que desafiam o sistema vigente. Acreditamos que pesquisa em arte tem modos de revelar processos históricos, sociais, éticos, políticos – a possibilidade de um giro através de um processo inventivo. A escrita performativa em revistas acadêmicas, portanto, se mostra um espaço de debate e realização desses modos, tanto de temas como de formas de pesquisa; uma demanda da classe por outras experiências incluídas no espaço reflexivo da academia.

Tanto se fala da necessidade de escuta daqueles que sempre foram autorizados a falar. Publicar textos performativos em uma revista acadêmica é, antes de mais nada, a possibilidade de desenvolver um lugar de escuta, para que o conhecimento que produzimos permita também insurgências de ferramentas, de modos e saberes próprios, para que outras pesquisas possam vir a criar métodos acadêmicos. É a busca de uma escrita acadêmica que não seja a manutenção de uma produção reduzida, protegida e conservadora, mas que seja uma construção coletiva de fundamentos, saberes e redes.

Com a perspectiva de construir coletivamente com as autoras e autores que contribuíram para esta coletânea, pensamos em estratégias de seleção dos materiais que nos chegaram de forma que não priorizássemos nenhum parâmetro formal pré-estabelecido, pois este já é um modelo bastante adotado em processos editoriais de revistas acadêmicas – nestas geralmente adaptamos nossos textos aos critérios e normas já existentes.

O importante para nós era fazer com que as experiências de escritas e metodologias das pesquisas não fossem apenas tema, mas um exercício reflexivo de e com forma e conteúdo. Receberíamos textos que não “coubessem” em outros dossiês, ou seja, textos que pudessem ser negados por revistas acadêmicas por não estarem em consonância com as formas pré-estabelecidas. Já estava posto desde ali que não seriam aceitas propostas que reproduzissem a mesma “construção do discurso linear, duro, falocêntrico” (Caballero, 2016, p.17) que pretendíamos destronar.

Pensar em uma escrita performativa é também trabalhar com idas e vindas, costuras, mapeamentos, fissuras. Convidamos pessoas que defendem outras escritas, sugerimos autorias coletivas. Os textos vieram, voltaram, vieram, voltaram, vieram... e alguns textos foram inteiramente reescritos.

As solicitações inicialmente enviadas através de comentários no documento se tornaram apenas o início da interlocução, quase que unanimemente seguidas de “mas como vou fazer isso?”. Para tanto, ajustes e concessões foram feitos para chegar a possíveis soluções; estratégias foram experimentadas por ambas as partes (pessoas editoras e escritoras) por meio de conversas informais por videoconferências, encontros em cafés, ou via Whatsapp® – muitas delas com áudios para afinar proposições e modos. Nosso desafio foi encontrar saídas para que cada texto recebido pudesse orientar parâmetros, e que esses pudessem se constituir numa espécie de polinização.

Uma imagem contendo texto  Descrição gerada automaticamente

Cada texto desta coletânea é de fato um universo, resultado de uma extensa negociação entre a equipe organizadora e as autoras e autores que colaboraram na escrita. Por se tratar de um volume especial, as normas de submissão da revista DAPesquisa ficaram suspensas.

Entendemos o texto como espaço investigativo em todos os seus desdobramentos, tais como os que acontecem nas inúmeras possibilidades de intersecção entre palavra e imagem. Muitos textos custaram muitas idas e vindas para que se chegasse a uma estrutura de diálogo entre prática artística/pedagógica e escrita performativa. Alguns apresentaram uma relação mais intrínseca entre forma e conteúdo: trouxeram exemplos práticos, explicitaram a escolha das referências e aprofundaram os temas propostos. Mas houve outros ainda os que não contestaram de maneira direta as estruturas tradicionais do texto acadêmico, ainda que estratégias que se opõem a um pensamento acadêmico epistemicida.

 

Pudemos pensar, através dos textos recebidos, possibilidades de escrita coerentes com nossos temas e modos de pesquisa, e entender também que publicar um dossiê de textos performativos significa ter muito mais passos para todas as pessoas envolvidas do que teria uma organização de um volume de revista – a descoberta foi mesmo coletiva.

 

Sendo assim, a coletânea tem a singularidade de cada pesquisa das pessoas colaboradoras e, enquanto um conjunto, é um convite à leitura de outros formatos e lógicas de escrita e potencial de desdobramentos, tornando-se um espaço e convite para seguir vestígios e pistas que não cabem no texto dito “acadêmico”, através do questionamento, enquanto tema e modos, dos próprios modos como a academia produz, gerencia e replica epistemologias.

 

O PORQUÊ DA ESCRITA PERFORMATIVA

Em geral, mesmo em Artes, temos uma produção de escrita acadêmica bastante condicionada, que reduz nossas proposições mais ousadas a temas de nossas pesquisas, sem transpô-las à escrita.

Há séculos tem-se pensado a postura da pessoa pesquisadora e as consequências da sua relação com o objeto de pesquisa. Seguindo um viés histórico, percebemos que em algumas áreas, a escrita vinha acompanhando, de forma instrumentalizada, os processos da crítica sobre a pesquisa. Isto se deve à suposição de que uma escrita objetiva e “neutra” assegura a seriedade e a legitimidade de uma pesquisa.

No entanto, a acusação de que as ciências sociais, por terem como objeto o ser humano, afetariam o processo de conhecimento por estarem impregnadas de subjetividade, é colocada em xeque já no início do século XX com a Teoria da Relatividade de Albert Einstein (1991).

Por outro lado, em outras áreas, a escrita foi pensada junto desse processo. Michel de Montaigne (2002) escrevia em primeira pessoa no século XVI, incorporando em seu procedimento, suas ações críticas sobre o saber humano. Em 1580, ao publicar Os Ensaios, cunha esse estilo que se desenvolve depois como um gênero literário.

Isto posto, é possível observar que há uma dualidade na prática da escrita, presente ainda em algumas áreas e setores da academia. O teatro é uma das que, tardiamente, tem incorporado a prática de pesquisa (de um objeto, tema ou processo) à escrita da pesquisa também como criação. Todavia, percebemos que, mesmo com toda a liberdade para a produção textual, o que sugeríamos nas conversas com as autoras e autores para organizar a coletânea era algo impraticado e impraticável. Mais que isso, há uma expectativa do formalismo acadêmico, mesmo na pesquisa em artes; sentimos a concretude do mito do que é (ou deve ser) a escrita acadêmica.

Alguns conceitos foram chave de entendimento para a nossa conversa com as pesquisadoras e os pesquisadores pela familiaridade destes. Na última década, especialmente, inúmeros estudos acadêmicos têm se utilizado dos termos performance, performance art, performativo, performático e a escrita performática em diferentes áreas do conhecimento. A performance art é amplamente discutida em estudos de diferentes áreas das artes e da comunicação; os termos performance e performativo são discutidos principalmente na filosofia da linguagem, na sociologia e na antropologia; e o performático e a escrita performática, especialmente nas letras e nas artes.

Ao nos aproximarmos da artista e teórica mexicana Diana Taylor (2013, p.45), compreendemos aqui a performance mais do que um tema de estudo, uma vez que para ela, a performance é mais do que um campo artístico, é uma episteme, um modo de conhecer. Sua escrita não possui o pretensioso distanciamento acadêmico, ao contrário, suas vivências atravessam o texto – o caráter performático de sua escrita permite uma sensação de proximidade para com as pessoas leitoras.

Defendemos então que o exercício da performance na pesquisa e na escrita é um desdobramento da pesquisa em artes, o exercício de outros modos em nossas práticas de arquivo enquanto acadêmicos. Sendo assim,

ESCREVER NA PESQUISA é o exercício de se permitir perceber que nossa percepção é um processo dialógico de fazer e referenciar, e que não é, mas está sempre em relação (Goffmann, 1959), sem uma estrutura fixada, mas mutável.

 

ESCREVER NA PESQUISA é compreender a fala, e consequentemente a escrita, como um ato (Austin, 1990): nossos enunciados (e nossos corpos) podem intervir, instaurar modos de ser/estar no mundo (Butler, 2011).

 

ESCREVER NA PESQUISA é um entrelugar das pessoas pesquisadoras-artistas que restaura procedimentos criativos, críticos, repensando nosso papel social (Schechner, 2006).

 

ESCREVER NA PESQUISA, mais do que comparações e valorizações pela crítica, é uma atitude de busca ativa da construção e manutenção de um lugar de diálogo, articulação de redes de pessoas, lugares, coisas, animais, instituições (Latour, 2012).

 

O que não podemos perder de vista é que, por estarmos lidando com pesquisa em arte, buscamos modos de


tomar consciência,

e buscar relações,

experimentar possibilidades

conhecer subjetividades,

praticar a liberdade,

deixar emergir,

subverter lógicas

_____________________(preencher com mais possibilidades)

 

Que a escrita aqui seja um ato, uma des-coberta de existências, mais do que uma descrição ou justificativa de nossas pesquisas. Que este seja um convite para a prática da escrita performativa na academia, e para um início de conversa.

As maneiras de continuarmos esta conversa são inúmeras, se você, leitora e leitor, tiver uma proposta, comentário, sugestão, desabafo que queria nos trazer, nosso contato é escritaperformativa@gmail.com .

 

 

REFERÊNCIAS

 

ADICHIE, Chimamanda Ngozi. The danger of a single story.  [S. l.: s. n], jul. 2009. 1 vídeo (18 min., 34 sec.). Website: TED Ideas Worth Spreading. Disponível em: https://www.ted.com/talks/chimamanda_ngozi_adichie_the_danger_of_a_single_story. Acesso em: 12 fev. 2020. 

 

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[1] O termo artista-etc foi cunhado por Ricardo Basbaum e originalmente publicado no texto em inglês I love etc-artists, parte do projeto The next Documenta should be curated by an artist, Basbaum propõe um artista de múltiplas camadas, provocando relações arte-e-vida. O texto em português foi publicado no Manual do artista-etc., em 2013, pela Azougue Editorial.

[2] Podemos dizer que o paradigma implica um movimento que vai de singularidade em singularidade e que, sem abandoná-lo, transforma cada caso singular em uma cópia de uma regra geral que nunca pode ser formulada a priori. (Agamben, 2010, p.29).

 

[3] Outro termo cunhado por Ricardo Basbaum: intersectando o espectador (aquele que observa) e o expectador (quem espera algo a partir do encontro com algo [no caso, com um trabalho de arte, por exemplo].

[4] [...] esta fase de mudança na cultura das artes é comparável, em extensão e profundidade, à transição que ocorreu entre os finais do século XVIII e meados do século XIX. (Laddaga, 2012, p.9).

[5] Cf: Brad Haseman (2006).

[6] Cf: Ciane Fernandes (2014).

[7] Cf: Sylvie Fortin & Pierre Gosselin (2009) e Camila Santos & Gisela Biancalana (2017)

 

[8] Cf: Eduardo Passos, Virgínia Kastrup e Liliana Escóssia (2009).

[9] Cf: Luciana Lyra (2010).

[10] Disponível em: https://www.thecityfixbrasil.org/2012/01/11/chines-transforma-mais-de-mil-bicicletas-em-obra-de-arte/

[11] Disponível em: https://www.picuki.com/media/2107665518971156932

 

[12] Referência ao livro A aventura de contar-se: Feminismos, escrita de si e invenções da subjetividade (2013), da historiadora feminista Margareth Rago. Nele, a autora fala das narrativas autobiográficas com as quais os feminismos puderam afirmar novos modos de existência. A relação entre escrita feminista e performativa é feita aqui a partir desse "contar-se/contar-nos", que revela nossos corpos na escrita.

[13] Teórica feminista, ativista social, professora e artista estadunidense. Gloria Jean Watkins adotou o pseudônimo bell hooks para sua produção artística e intelectual, inspirada em sua bisavó materna. Ela afirma que seu uso inconvencional das letras maiúsculas tem dois motivos: a diferenciação entre ela e sua bisavó e o enfoque ao que é mais importante em sua obra – sua escrita e não sua pessoa.

[14] bell hooks nos conta também sobre a importância das discussões sobre raça e classe em um feminismo que seja realmente revolucionário. A igualdade de gênero não pode ser pensada sem a quebra das visões utópicas de sororidade, sem a consideração das diferenças que, na estrutura social existente, mantêm a opressão de mulheres racializadas e/ou pobres enquanto confere poder a mulheres brancas e economicamente privilegiadas.

[15] Uma de nossas ações foi aproximar algumas autoras através de uma troca de cartas, esta parece nos dar pistas para entender o que pode ser uma escrita performativa. Não é apenas o formato da carta (ou qualquer formato diferente de uma formatação tradicional acadêmica) que garante uma performatividade. O que está em jogo não é apenas o formato. A primeira carta suscita o debate pela reflexão sobre e com o fazer. A escrita dessas quatro mulheres é um convite às metodologias que se desvendam na prática.

[16] O filósofo Agamben em Infância e História (2005) explica que nós, sujeitos contemporâneos, estamos expropriados de experiência, o que, de certa maneira, “é uma consequência que estava implícita no projeto fundamental da ciência moderna” (p.25-26).

[17] Alusão à palestra O perigo da história única (2009) da escritora nigeriana Chimamanda Adichie, disponível em: https://www.ted.com/talks/chimamanda_ngozi_adichie_the_danger_of_a_single_story/.

[18] Personagem drag queen de Arthur Gomes, disponível em: https://www.instagram.com/risotril/.

[19] Muitas dessas minibios, concedidas pelas pessoas autoras dos textos desta edição, estão também presentes na apresentação das autorias de cada texto.

[20] A título de curiosidade citamos três profissionais de disciplinas distintas: Tereza Rocha (2016), dramaturga e professora na graduação em dança (UFCE), em uma palestra de apresentação de seu livro O que dança contemporânea? (2016) questiona com ele a prática em dança estar sempre nas notas de rodapé. Sérgio Medeiros (2019), escritor, poeta e professor de literatura (UFSC), confessou em uma fala sobre sua pesquisa artística que esta não tem espaço no seu trabalho na academia. Marta Martins (2019), artista e professora de Artes Visuais (UDESC), desabafou em uma de suas aulas na pós-graduação que o artista na academia está “sempre pedindo para ter autorização para ser artista, sempre se explicando”.

[21] Tereza Franzoni e Monique Vandressen, ambas professoras do Programa de Pós Gradução em teatro da UDESC.